O PORQUÊ DO PICA MIOLOS

Mais do que um espaço, a CasaViva é um meio de provocação. Nunca foi um projecto meramente artístico
ou cultural. Muito menos uma ideia comercial ou pretensão de figurar no mapa da noite portuense.

A CasaViva é um esforço de cidadania, um espaço de activismo, com aspirações a anfetamina que combata a letargia
e a incapacidade de indignação. Para contrariar essa instituída forma de pensar, ser e conformadamente estar e viver.

Se o espaço é temporário, o projecto não quer ser efémero. Nasce, assim, o "Pica Miolos", folha de opiniões
numa resenha de notícias que nos foram chegando e tocando mais profunda ou especialmente.

Seguirá um critério necessariamente tendencioso, como todos os critérios editoriais
de todos os media que se dizem imparciais. Objectivo: picar miolos.

E assim participar na revolução das mentalidades desta sociedade acrítica
e bem comportada e demonstrar de que lado do activismo a CasaViva vive e resiste.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Chamem a polícia, que eu não saio da praça

Estavam à nossa espera. O blog anunciava o início da festa às 11h00, mas passava do meio-dia quando começamos a montar bancas, mesas, cadeiras, bancos, cavaletes, xadrez, livros, pincéis e papéis na praça do marquês. Apareceram de imediato. PSP, dois agentes, um dos quais graduado. O mesmo que comunicou ao primeiro que abordou que ali não podíamos estar, por se tratar de um evento anunciado, o blog que haviam consultado assim o confirmava e tal carece de licença, coisa de que não dispúnhamos.


“Evento” … o termo, e respectiva definição, desenrolou uma conversa de mais de uma hora. Sobre este e outros conceitos não se chegou a consenso algum. Ficou o aviso: “sujeitam-se a que apareça a polícia municipal e apreenda todo o material que aqui se encontra”. Pretendíamos, apenas, provocar um encontro numa praça da cidade, um encontro para distribuir informação, conversar, jogar xadrez ou jogar à petanca, pintar, fotografar, ler, estar. Regado com alegria de palhaços e almoço popular. Tudo isso aconteceu.


Pelas 16h30, quando a também anunciada polícia municipal surgiu, recolhíamos já à CasaViva, um espaço de propriedade privada mas porventura dos mais públicos na verdadeira acepção da palavra. A fachada exibia então um Aviso Público: A censura é sempre mais violenta do que qualquer faixa. Ao contrário da autoridade, a CasaViva não censura, não criminaliza, não mata.


Como a realidade lá fora é outra e porque o desconhecimento da lei não é desculpa para poder prevaricar no que à mesma diz respeito, com a colaboração do referido simpático agente no seu esclareci­mento, elaborou-se o possível:



Manual de Frequência

do Espaço Público



1. Não se pode montar bancas de informação, com ou sem rodas, mesmo que não existam transacções comerciais. Pode distribuir-se propaganda desde que autoportante e, em caso de cansaço físico, só se pode sentar e/ou pousar essa informação em mobiliário municipal por poucos segundos, talvez um minuto, a lei parece não ser muito precisa.



2. Não se pode trazer um sofá para a praça e confortavelmente sentar-se ao sol a ler um livro, mas pode-se trazer uma cadeirinha, cuja dimensão parece que a lei também não refere com precisão, nem o tempo em que essa cadeirinha poderá estar a incomodar no espaço público. Segundo o agente graduado, a grande diferença entre um sofá e uma cadeirinha, numa praça, é o facto de o sofá levar os transeuntes a questionarem-se do porquê de tal mobiliário "anormal". Está a dizer-me, então, que a lei existe para defender as pessoas de se interrogarem sobre o que as rodeia? "Sim.” E que, portanto, a lei existe para normalizar as pessoas impedindo-as de exercerem o seu espírito crítico? "Sim.”


3. Pode-se ter um cavalete para qualquer cidadão pintar, mas se for mesa, nem que seja para crianças, já não pode ser.


4. Pode-se ter e estar a jogar xadrez num tabuleiro desde que não incorpore uma mesa.



5. Para se realizar um encontro com mais de três pessoas, este não pode ser anunciado na internet, pois será considerado organizado e portanto carece de autorização do Governo Civil. Mas se esse ajuntamento já tem história, é tradição, já pode livre e espontaneamente acontecer, conforme comprova o ajuntamento dos senhores do jogo da sueca, diariamente na praça do marquês. E para ser considerado tradição não chega ter como antecedentes só dois outros encontros, não se sabe se os nossos recentes três já serão suficientes.


5.1 Se o encontro for numa praça, por mais que seja um local de estar, é preciso ter cuidado quanto ao fim a que se destina, para não pôr em risco o que ela por definição não é, corredor de circulação pedonal. Ficai os interessados também a saber que se corredor fosse teria de se chamar Stª. Catarina e ser ocupada na altura em que está vedada ao trânsito automóvel. Se assim for, já isto e muito mais poderá acontecer e mesmo que bloqueie a passagem de um transeunte desinteressado não carece de autorização do Governo Civil.



5.2 Se clandestinamente organizar qualquer coisa, evite chamar-lhe evento, escamoteie o facto de ser organizado, mesmo que o não seja e verifique se está numa praça e se na sua fronteira existe algum edifício do qual possa sair gente considerável que necessite atravessá-la, como, por exemplo, uma igreja. Pois é, parece que o espaço público, apesar de assim se manter nomeado e além de cada vez mais parco nas nossas cidades, está cada vez mais parecido, nas suas limitações, com o espaço privado.


6. Embora o que dizem que a lei diz, não diz se o que no dicionário quer dizer é o que a lei diz. Para quem necessite ou deseje frequentar o espaço público, fique a saber que um dicionário de 2009 diz o seguinte:

“Evento”, do latim eventu, acontecimento;

“Organização”, acto ou efeito de organizar, preparação, planeamento, disposição que permite o uso e funcionamento eficiente, relação de coordenação e coerência dos diversos elementos que formam um todo;

“Praça”, do latim platêa, praça pública, lugar amplo, zona de estar, geralmente rodeado de edifícios [o que quer dizer que as ruas que a ladeiam são a área de circulação desse espaço];

“Rua”, do latim ruga, sulco, caminho, via ladeada de edifícios, zona que privilegia a circulação.


7. Mesmo assim se a sua acção levar os transeuntes a saírem das suas vidas pacatas, questionando-se na sua realidade e na do mundo que os rodeia, já corre sérios riscos de apreensão de todo o material por parte da polícia municipal e, no mínimo, são necessárias identificações dos provocadores dessa acção. Corre ainda um outro risco, o dessa acção ser considerada crime contra a paz pública, isto se subjectivamente tornar viável a hipótese de um cidadão, e basta um, com “um nível cultural baixo”, mais uma definição em que a lei peca por falta de precisão, interpretar mal a acção e desta forma sentir-se impelido à violência; pode vir a ser acusado de terrorismo, o que não será forçosamente mau se desejar alguma projecção nos média, desde que arranje um bom advogado para não acabar a gozar a sua glória aos quadradinhos.



Querem melhor e mais genuína, vindo de quem vem, explicação da lógica das leis? São estes os nossos sete pecados mortais a acrescentar às razões que contribuem para esvaziar o espaço público, torná-lo mais inseguro e, portanto, necessariamente mais policiado, violento e repressivo, em cidades cada vez mais elitistas de gente que se auto-enclausura em condomínios fechados que proliferam como cogumelos. Esta chama-se Porto Vivo, até podia ser vip mas é zip (zona de intervenção prioritária): um somatório de casas devolutas a recuperar para uma população influente, endinheirada, a bem de uma cidade chique, cuja alma é empurrada para os subúrbios. Porque a alma é a gente que lá nasceu, cresceu e viveu, com conta na mercearia, que pode contar a história daquela esquina, que conhece o vizinho que lá viveu antes, o barbeiro que já fechou e as vendedeiras do Bolhão de geração em geração. É a morte da cidade Aniki Bobó.


Tudo isto obriga a uma actualização de conceitos, pois praça, rua, casa, espaço público e privado já não são o que eram e nem um gajo que queira ser “um cidadão exemplar” sabe como agir. Portanto, já sabem, quando saírem de casa deixem o espírito crítico na gaveta da mesinha de cabeceira senão sujeitam-se a que, em Portugal, hoje e amanhã… a autoridade vos tente amordaçar.

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