Índice
Fim à proibição do cânhamo/cannabis
O PORQUÊ DO PICA MIOLOS
Mais do que um espaço, a CasaViva é um meio de
provocação. Nunca foi um projecto meramente artístico
ou cultural. Muito menos
uma ideia comercial ou pretensão de figurar no mapa da noite portuense.
A CasaViva é um esforço de cidadania, um espaço
de activismo, com aspirações a anfetamina que combata a letargia
e a
incapacidade de indignação. Para contrariar essa instituída forma de pensar, ser
e conformadamente estar e viver.
Se o espaço é temporário, o projecto não quer ser
efémero. Nasce, assim, o "Pica Miolos", folha de opiniões
numa resenha de
notícias que nos foram chegando e tocando mais profunda ou especialmente.
Seguirá um critério necessariamente tendencioso,
como todos os critérios editoriais
de todos os media que se dizem imparciais. Objectivo: picar miolos.
E assim participar na revolução das mentalidades
desta sociedade acrítica
e bem comportada e demonstrar de que lado do activismo
a CasaViva vive e resiste.
Fim à proibição do cânhamo/cannabis
Nasceu fez um ano: uma folha com opiniões e notícias que nos foram chegando e tocando mais profunda ou especialmente, seguindo critérios necessariamente tendenciosos, como todos os critérios editoriais de todos os media que se dizem imparciais. O segundo chegou na Primavera, manteve o formato A7, que se desdobra até um A2. O Verão trouxe o terceiro, com cd em mp3 das bandas que tocaram na CasaViva. O Pica Miolos muda de forma e a forma como apresenta as notícias e opiniões. No Outono, sem cd, adopta o tamanho A6 que se desfolha e insiste na produção própria.
De novo a Primavera, mas sem grandes esperanças. Na procura dum mundo onde possamos estar abrigados e livres, anuncia-se o Espaço contra a Autoridade para 11 e 12 de Abril. As galinhas rebeldes forjaram aproximações e deram bicadas por toda a cidade, em especial no Bolhão, onde o Rio que tudo arrasta quer fazer um centro comercial. Até que, humanamente, o Porto não seja mais do que um baldio.
Sócrates traz-nos memórias de infância quando esconde as verdadeiras histórias e a estória verdadeira da ligação África-Europa. Acolhem-se ditadores e expulsam-se os descartáveis, estórias de fronteiras que se atravessam nos caminhos das pessoas.
Com um pé no País Basco e outro na realidade do arrendamento jovem em terras lusas, os ouvidos nos alertas ao sindicalismo actual e o nariz preparado para a próxima MGM, animando a alma em ritmos mais ou menos acertados de concertos vários, mantemo-nos a participar na revolução das mentalidades desta sociedade acrítica e bem comportada, demonstrando de que lado do activismo a CasaViva vive e resiste.
A ideia de espaço público constitui – já desde a antiguidade clássica – a base da democracia enquanto prática quotidiana. Se, na antiga Grécia, esta nunca foi alargada à grande parte da população (mulheres, estrangeiros e escravos nomeadamente), actualmente a sua inexistência é inerente à própria condição cidadã. A democracia, de dinâmica passou a regime, e o espaço público – onde as grandes questões eram alvo de decisão por parte das pessoas – foi destruído e “dividido” em fábricas e outros locais de trabalho, centros comerciais, clínicas psiquiátricas ou centros de dia. A vida passou a ser uma realidade espácio-temporal baseada na incessante satisfação de necessidades e não na reflexão, no debate, no livre pensamento, na possibilidade e responsabilidade de decidir sobre o que nos diz respeito.
A 11 e 12 de Abril, a CasaViva abre-se a todas as pessoas e colectivos que nela queiram viver por esses dias e partilhar perspectivas e acções relacionadas com a questão da ocupação, aproveitando os dias europeus de acção de apoio a squats e espaços autónomos lançados pela rede Squat.net. O desafio é o habitual. Tragam ideias de acção (e tudo o que elas precisarem para serem levadas a efeito) e disponibilidade para participar nas acções pensadas por outras pessoas. Venham preparados para serem co-gestores do espaço.
Sendo a mobilidade um sinal dos tempos, onde o local de trabalho e de estudo é agora um lugar cada vez mais temporário, onde com mais frequência temos a necessidade de recomeçar as nossas vidas, evitando uma conjuntura socioeconómica e política cada vez mais repressiva, o que parece fazer sentido é desenvolver uma lógica do mercado de arrendamento mais favorável. Ao invés de continuar a favorecer os lobbies da construção, do betão e das imobiliárias, onde a compra de casa atinge preços absurdos, num mercado que insiste em assim permanecer, apesar da falta de poder de compra da classe média, apesar dos grandes centros urbanos transformarem o seu tecido em tecido devoluto, criando as condicionantes para a sua ruína.
Entretanto, aumenta a promiscuidade das autarquias com bancos, imobiliárias e grandes empresas de construção. Em que estas megaestruturas económicas financiam as campanhas dos partidos políticos com mais representatividade no país e, à troca, viciam-se os concursos de arquitectura, enriquecendo cada vez mais os caciques da construção que dividem entre si o território nacional.
O que parece fazer sentido é rentabilizar os recursos existentes, preservar e reciclar, num esforço e numa lógica de arquitectura sustentável. No entanto, abrimos espaço a uma construção de arquitectura duvidosa e descaracterizante, caminhando para cidades sem história, com edifícios transformados em autênticas máquinas de gerar dinheiro e onde todos os intervenientes têm responsabilidades.
E, no meio deste absurdo, deixa de ser rentável para os senhorios manter as suas propriedades sem exagerar no valor da renda e para os arrendatários aguentar esta despesa, onde comprar casa já não é investimento, mas, sim, certeza de endividamento.
Afinal, o que parece fazer sentido é alienar todo o património edificado. Para quem e para quê? Não sei, se calhar para todos e para ninguém, pois todos precisamos de um abrigo, mas não precisamos de ser donos desse território, pois de recolectores passamos de novo a caçadores de uma vida melhor e mais diversificada como contraponto desta globalização intoxicante.
As galinhas andavam dispersas. Orgulhosamente rebeldes em relação à voz dos que pretendiam ser seus donos, mas secretamente amarguradas por se sentirem sozinhas nesse seu viver. Era, logicamente, preciso satisfazer todas as necessidades que a sua condição de galináceo impunha, picar o chão, espolinhar, esgravatar terra. E era, para elas, igualmente importante, sempre que sobrava tempo e energia, rejeitar a submissão e lançar umas bicadas ao carcereiro. Se, ao menos, houvesse mais que, como eu, sentissem vómitos à medida que iam sabendo mais sobre o mundo..., pensariam.
Foi sobretudo por isso que aquele dia foi mágico. Tantas caras nunca dantes vistas de outras que também apontavam o seu bico, as suas armas desafiadoras, ao alvo que a sua sensibilidade própria indicava. Algumas tinham experiências de encontros anteriores onde o cacarejar se tinha sobreposto à ânsia de mudança. Aqui, com a tal magia que todas terão sentido, isso não tinha como acontecer. Ressalve-se, claro, que o cacarejar, aquilo que os humanos traduzem por falar, é a base sustentatória das investidas das galinhas rebeldes. Sem ele, não se chegará longe. O que, no fim-de-semana de 14 a 16 de Dezembro de 2007, ficou patente é que não tem, necessariamente, que se começar por esse lado. Havia, naquele segundo andar da CasaViva, ganas de picar. E começou-se antes por aí, ou não estivéssemos no ninho dessa outra ave insubmissa, o Pica Miolos. Nessa mesma noite, a primeira, umas poucas atreveram-se a, de forma propositadamente agradável à vista, lançar o seu grito contra a precarização da vida e a descartabilização dos indivíduos. Nem que fosse só por isso, tinha valido a pena. Mas foi por muito mais.
Foi bom ver que sábado trazia, de novo, sol. O pequeno-almoço prolongou-se por várias horas, como sempre acontece quando a refeição, entendida como muito mais do que a simples comida que a compõe, sabe bem. Durante esse tempo, ultimaram-se alguns pormenores e discutiram-se, de forma mais concreta, as acções que se tinham aflorado na conversa da noite anterior. Não seriam mais do que 13h30 quando, das portas da CasaViva, saíram cerca de trinta, com três carrinhos de compras e o grito mais ensurdecedor que o capitalismo pode ouvir, o da ausência de preço. Estava-se, não o esqueçamos, em plena época natalícia e, ao mesmo tempo que três ou quatro perguntavam aos passantes qual a primeira coisa que lhes vinha à cabeça quando ouviam a palavra transgénicos, uma Loja Livre, três carrinhos de supermercado cheios de produtos gratuitos, percorria demoradamente a Rua de Sta. Catarina, do Marquês à Batalha. O impacto foi enorme. Muitas levaram coisas, várias conversaram sobre as motivações de tão bizarro acontecimento, uma ou outra terão encontrado ali uma prenda de natal que, repare-se, deixaram de comprar. Nem que fosse só por este último pormenor, tinha valido a pena. Mas foi por muito mais.
Chegadas à Batalha, as galinhas metamorfosearam-se. Os pregões mudaram com a roupa, os carrinhos da Loja Livre foram camuflados e apareceu, de repente, uma mancha de empresários que lançavam o PIDE (Partido Independente de Defesa do Empresariado). As mesmas que tinham descido Sta. Catarina, subiam-na agora, berrando por salários mais baixos. apelando à submissão a todos os ditames das empresas. Um flyer que acompanhava a marcha serviu para que quem andasse pela rua naquele sábado levasse para casa uma explicação sobre o que acabara de presenciar. Talvez algumas compreendessem o que se pretendia e, quiçá, uma tenha concordado. Nem que fosse só por isso, tinha valido a pena. Mas foi por muito mais.
De volta a Casa, decidiu-se, mesmo que nem se tenha falado disso, sentar, relaxar, tomar um café, fumar um e ouvir uma musiquinha. Mais tarde, quando a noite começasse a cair, sair-se-ia de novo, desta vez com uma mega piroca, ou não fossem também estes os dias que se seguiam aos da assinatura do Tratado de Lisboa e da grande masturbação nacional que esse baptismo provocou. Soubessem os portugueses o que significa verdadeiramente o tratado e talvez não andassem com o ego tão inchado por ter o nome duma cidade do seu país.
A estupefacção dos transeuntes, se já tinha sido visível nas acções anteriores, era, nesta, brutal. O que faria um pénis de dois metros a passear-se, em cima dum andor, por toda aquela distância que separa o Marquês dos Aliados? Ah! É o Tratado de Lisboa!, chegaram a afirmar alguns passantes, depois de verem as pancartas (“O Tratado tira-nos mais direitos laborais e liberdades civis, mas é NOSSO!”, ou “Nem sabemos o que diz o Tratado de Lisboa, mas é NOSSO!”), como se essa explicação lhes bastasse. Hoje vimos uma piça gigante por causa do Tratado de Lisboa, terão dito, sem mais explicações, em casa ou no café. Nem que fosse só pela dúvida que se lançou entre quem viu tal procissão, pela necessidade interior que terão sentido para perceber o que se estava a passar, tinha valido a pena. Mas foi por muito mais.
Desceria o falo as ruas da cidade quando, na Baixa, se acendeu a árvore que, com o patrocínio da câmara municipal do Porto, publicitava uma instituição financeira em terrenos públicos. Por razões que a razão conhecerá, esse objecto, também ele fálico, atraía multidões àquela zona. Foi no meio dessa mole que a piroca se metamorfoseou em suporte de estrela de natal que encimava um presépio onde o menino que se adorava era o Euro, como símbolo de todos os conceitos que se podem dar à noção de dinheiro. Com personagens vestidos a rigor, essa pequena performance acabaria por chamar a atenção de muita gente, incluindo alguns polícias que nunca chegaram a perceber que o que ali se passava era exactamente aquilo que eles, a julgar pelas suas perguntas, não queriam que acontecesse: uma manifestação política. Um flyer ajudava a que se conseguisse chegar até àqueles que decidissem deixar para mais tarde o parar para pensar. Afastados, pela ignorância, os únicos que podiam chatear, soltaram-se as gargantas ao som de poemas críticos da nova rede da STCP que alguém se lembrara de escrever e musicar. Nem que fosse só pelo caricato episódio com a polícia ou por esse momento de quebra colectiva de vergonhas que foi o das Janeiras Sociais, tinha valido a pena. Mas foi por muito mais.
Nessa noite, alguém fez o jantar, alguém lavou casas de banho, alguém varreu algumas salas, cada uma lavou o seu prato, a autogestão adquiria novos sentidos e deixava a sua condição de utopia através da prática. Imperfeita, é certo, ou não vivêssemos em galinheiros onde se castra tudo o que vai nessa direcção. Entre tudo isto, e todas juntas, puderam maravilhar-nos com o humor e a qualidade de Pedro::Diana e de Thomas Bakk.
Não foi difícil, portanto, que, no domingo, acordassem com o sentimento de que cada uma delas estava mais forte, mais consciente, mais disposta a colocar a sua asa sobre o corpo de qualquer outra que pudesse necessitar de ânimo em alturas em que ele se desvaneça. Não era o caso naquele dia. Não depois de um sábado daqueles. Estavam cansadas, é certo e pouco estranho, principalmente para aquelas que tinham aproveitado as primeiras horas de domingo para berrar por espaço e prioridade para os transportes não poluentes. O pequeno-almoçoo demorou ainda mais do que o anterior, como se houvesse uma necessidade qualquer de estarem juntas, calmas, aconchegadas.
O Sol já estava na sua curva descendente, já se tinha abortado mais do que uma acção que uma ou outra tinham preparado, quando as portas da CasaViva se voltaram a abrir para que todas saíssem em direcção ao Jardim das Virtudes, esse espaço amplo e lindíssimo que a incúria camarária tem votado ao abandono, policiado para que ninguém entre, de forma, talvez, a que a desabituação do seu usufruto não provoque saudades quando lá se construir alguma coisa. A decisão sobre o que lá se faria foi sendo tomada pelo caminho e, quando lá se chegou, saltaram-se muros e portões, estendeu-se a toalha, partilhou-se comida e não se quis sair sem deixar bem visível que se tinha lá estado a reapropriar um espaço subtraído à comunidade e que não se concordava com as prioridades do edil. Nenhuma se esquecerá, nos momentos que antecederam a invasão, do que disse aquela que passava por ali e que, sendo da zona, as animou a entrar, confessando já ter feito o mesmo quando precisou daquele espaço. Nem que fosse por ver como o activismo de cidadania é praticado pelas pessoas mais insuspeitas, tinha valido a pena. Mas foi por muito mais.
Voltaram extenuadas. Algumas, mais resistentes, ainda encontraram forças para largar balões com mensagens anti-consumismo numa das suas mais afamadas catedrais. Uma acção que, infelizmente, algumas já não conseguiram acompanhar, mas que todas puderam conhecer, nem que fosse por vias travessas, como sejam os relatos de alguém ou aquele vídeo delicioso que acaba logo a seguir a ver-se aquela moçoila, feliz por ter conseguido tornar-se proprietária dum dos balões que caíam, lançados sabe-se lá por quem, a dirigir-se à mãe Oh Mãe, mãe... Preenche o teu vazio com compras. Nem que fosse só por esta imagem tinha valido a pena. Mas terá sido por muito mais.
Domingo, para além dos sabores trazidos de Setúbal, acabou ao som de Abdul Moimême (sax), Henrique Fernandes (contrabaixo) e Gustavo Costa (percussão), com o que se poderá referir como a súmula do fim-de-semana, ou a demonstração da validade dum encontro fortuito em que, a uma base pré-definida, se juntam os ingredientes mágicos da espontaneidade e do improviso, de forma a conseguir-se prazer e resultados concretos.
As galinhas estiveram juntas. Voltariam cada uma a seu canto, mas já sabiam que não esgravatavam sozinhas. Melhor, tinham gostado de esgravatar juntas. E pior não pode temer o carcereiro.
Fotos em
osencontrosdagalinha.blogspot.com
casa-viva.blogspot.com
“Ó ’mor, não quer uns moranguinhos frescos? Um euro e meio.” O pedido repete-se para quem se lhe atravessa à frente da banca, no corredor principal, virado para a Rua Formosa. “Quando voltar a passar”, ouve em resposta. “Então, venha ter comigo que lhe arranjo uns bons.” Se o diálogo é comum, dos pregões nem se fala. Há quem os repita ali, naquele local, há mais de 40 anos. Mulheres sobretudo. Mas já se ouvem ali, naquele lugar, há mais de 150 anos, já então mercado de frescos, génese do Mercado do Bolhão edificado na segunda década do século XX.
Hoje, cento e cinquenta anos depois, Primavera 2008, o mercado está ameaçado de morte: a Câmara Municipal do Porto prepara-se para, a qualquer momento, o ceder a privados, por 50 anos, para ali fazerem o que muito bem quiserem, provavelmente mais um centro comercial.
Provavelmente, porque o povo não conhece o projecto, tão pouco os comerciantes do Bolhão. Só os inquilinos das lojas do exterior do edifício são chamados comerciantes; os que estão no interior são ocupantes, pagam licença, são pouco mais de centena e meia. Talvez por isso, Fernando Sá foi o primeiro, neste processo, a apelar à defesa do Bolhão. Fernando Sá é presidente da Associação dos Feirantes do Distrito do Porto e, em notícia do JN, perguntava em meados de Dezembro 2007: “onde estão os movimentos cívicos que em época de eleições se moveram pelo Bolhão, onde está a cidade, onde estão os portuenses?”.
Faltavam poucos dias para a câmara supostamente aprovar um contrato de cedência do Bolhão, por 50 anos, à TCN. A oposição votou contra. Razão: dúvidas sobre o contrato, muitas dúvidas. Um mês depois, quando o assunto foi à Assembleia Municipal, Joaquim Massena veio à praça pública denunciar a intenção de demolição do Bolhão e de destruição da sua essência e recordar que dez anos antes a Câmara lhe pagou um projecto arquitectónico de requalificação do mercado, ganho em concurso público, no qual prevalece o edificado existente e a vivência que lhe dá alma. Um projecto da sua autoria aprovado pela autarquia e pelo IPPAR, que custou ao erário público cerca de um milhão de euros e que Rui Rio arquivou, lançando um outro concurso com um júri sem arquitecto, tendo por objecto “concepção, projecto, construção, manutenção e exploração, mediante a constituição do direito de superfície, do espaço denominado ‘Mercado do Bolhão’” e duração “a propor pelos concorrentes, que não ultrapassará os 50 anos”. Além da TramCroNe, do grupo holandês TCN, concorreu o grupo Amorim.
A TCN anuncia uma aposta de 50 milhões de euros na transformação do Bolhão. Promete manter a traça original exterior e partilhar a área comercial tradicional com novas lojas, metade das quais de cultura, lazer e restauração, construir dois pisos subterrâneos para cargas e descargas e estacionamento para 216 automóveis e um piso intermédio entre os dois actuais pisos, e criar habitação nos torreões. Dois anos de obras, a acabarem a tempo do natal de 2009. Contrapartida para o município: um milhão de euros aquando da emissão da licença de construção e uma percentagem dos resultados de exploração a partir do décimo ano. E adeus Bolhão.
Os promotores do negócio gabaram-se: “Neste projecto, os comerciantes não são problema, mas a solução”. São apenas divulgados esquissos de um projecto exclusivamente avaliado pela vertente económica. “O perfil longitudinal aponta para a ocupação integral desde o rés-do-chão até às galerias. (…) O interior será todo demolido para dar lugar a cobertura de lajes e betão armado”, denuncia o arquitecto Joaquim Massena em entrevista ao JN, 9 de Janeiro último. Até à data, vieram a lume outros desenhos e variáveis versões da ocupação do interior. O certo é que as dúvidas persistem, nomeadamente sobre a existência de projecto arquitectónico e sobre o juízo do Igespar, entidade reguladora do património edificado que sucedeu ao IPPAR, cujo parecer positivo é imprescindível, por se tratar de um edifício classificado.
Quando Joaquim Massena veio literalmente à praça pública, em frente à Câmara Municipal do Porto, apelar à cidadania dos portuenses para se unirem e impedirem a destruição do Bolhão, dentro do edifício os deputados municipais aprovavam por 27 votos contra 26 a deliberação do executivo de entregar o Bolhão à TCN. Cá fora, Massena estava acompanhado de estudantes de arquitectura que, com outros, se ligaram e criaram o movimento de estudantes (manifestobolhao.blogspot.com) e que convocaram por email o encontro de uma meia centena de pessoas nessa noite de 21 de Janeiro. Dentro de 60 dias o contrato seria então assinado. Pela via legal, restavam 30 dias para o impedir.
Dias antes, num encontro da galinha na CasaViva, alguém do GAIA (Grupo de Acção e Intervenção Ambiental) referira a urgência em fazer algo para chamar a atenção para a iminente privatização e transformação do Mercado do Bolhão no terceiro centro comercial da Baixa do Porto. Aliadas as vontades, junto a Almeida Garrett, nessa fria noite de Inverno, anunciaram-se debates para divulgar o assunto no Ateneu Comercial e no Café Ceuta. Estava iniciada a mobilização em defesa do Bolhão.
2 de Fevereiro, primeira manhã de sábado de outras que se haviam de repetir em manifestações de animado protesto contra a decisão camarária, as mulheres receiam perder o Bolhão. Há as conformadas, outras estão cansadas. Algumas erguem os braços: “O Bolhão é nosso!” É nosso e é desolador vê-lo assim tratado, em parte abandonado, em parte espartilhado em obscuros andaimes. Com fios eléctricos como se cordas de estender a roupa fossem, cruzando-se no chafariz de quatro bicas a meio do terreno que outrora foi lameiro de quinta de condes.
Apesar de a Câmara Municipal do Porto o ter mandado construir em 1837, conta A. Martins em www.ippar.pt, “apenas em 1851 se iniciou a sua edificação no mesmo local onde já funcionava um mercado constituído por estruturas ainda demasiado precárias e transitórias, num momento em que uma das artérias mais movimentadas da cidade – a Rua Sá da Bandeira – começava a ser rasgada”. O mercado foi transformado no que é hoje pelo arquitecto António Correia da Silva. “Um dos primeiros exemplares de betão armado construído na cidade”, disse, em recente tertúlia, Manuel Correia Fernandes, arquitecto envolvido no movimento decidido a travar a demolição do Bolhão.
“Ocupando todo um quarteirão, o Mercado do Bolhão apresenta planta rectangular alongada, com linhas arquitectónicas e gramática decorativa de fundo neoclássico tardio, algo aproximado às do arquitecto José Marques da Silva (1869-1947), como a Estação de S. Bento, não só na linguagem arquitectónica como na própria monumentalidade exibida que, no caso do mercado, será acentuada pelos torreões colocados nas esquinas”, descreve o IPPAR. Os mesmo torreões que Rui Rio concede que se transformem em habitação, fronteiros a centenas de casas devolutas.
“O Bolhão também é cá em cima”, gritam, lá dentro, as mulheres no varandim, ao ouvirem os bombos e as rimas no andar de baixo. Nessa manhã de sábado, algum povo mais foi ao Mercado do Bolhão, por mor que ele não venha abaixo. Para que todos saibam, para mostrar aos que resistem que estão acompanhados, para somar assinaturas a uma petição para que o mercado não seja destruído e substituído por um centro comercial.
Subida; Descida. Indicam azulejos nas paredes das escadarias junto aos portões laterais, para quem entra pela Rua de Sá da Bandeira ou pela Rua de Alexandre Braga. Entre descidas e subidas, diversas escadarias interligam os dois pisos do mercado. Sobe-se pela esquerda, desce-se pela direita. Uma ordem que faria sentido noutros tempos, mas que já não importa, até porque algumas escadas estão intransponíveis, transformadas em armazém. Desce-se e no pátio central, subdividido em dois espaços exteriores por uma galeria coberta construída nos anos 40, de novo o acesso à Rua Formosa. Sobe-se e há galerias em parte desertas e mulheres entre legumes nas alas próximas da entrada a norte, Rua de Fernandes Tomás.
Mulheres cansadas. Que não conhecem o futuro do Bolhão, seu local de trabalho, ganha-pão e convívio. Não se sentem representadas pelo Sr. Alcino, o presidente da Associação dos Comerciantes do Bolhão, que integra a comissão de acompanhamento do processo de transição do mercado, a par do vereador Lino Ferreira e de Pedro Neves, engenheiro de obra da TCN. Algumas tornaram-se presença assídua nas reuniões que a partir de Fevereiro passaram a realizar-se, às terças-feiras, ao fim da tarde, na Associação de Beneficência Familiar, na Rua Formosa. Para preparar acções contra a demolição e privatização do Bolhão.
Não é ainda conhecida, o projecto idem, nem tão pouco o andamento do processo judicial. Do contrato não se voltou a ouvir falar. Na terça-feira, 25 de Março, o Bolhão foi à Assembleia da República, os representantes da PIC foram recebidos pelos grupos parlamentares. Anunciava-se uma exposição e um ciclo de debates no Orfeão do Porto com início a 28 de Março, já o Pica Miolos se preparava para a impressão. Os comerciantes continuavam a ocupar o interior do mercado. Pouco mais certezas, se não que o edifício necessita urgentemente de obras que a Câmara se recusa a pagar ou, tão pouco, a procurar financiamento para uma requalificação que é da sua responsabilidade.
A bem ou a mal, o Bolhão vai mudar. Resta ainda saber se as escadarias continuarão a interligar os dois pisos do mercado e se os azulejos “Subida” e “Descida” não se transformarão em peças decorativas sem indicarem caminho algum. Se assim for, deixar-se-á certamente de ouvir ao raiar do dia: “Ó ‘mor, compre-me para me estrear”.
A cidade também se dissolve. Mesmo antes do amanhecer, conserva ainda alguma da sua beleza. Vazia, deserta, só, mostra-se em todo o seu esplendor. Tão intenso, que certos locais não se deixam mais admirar, apenas espreitar, como se a rua fosse o local de um crime acabado de ocorrer. Seguindo o canto dos seus cantos mais escuros somos surpreendidos frequentemente pelos encantos dos cantos que se seguem e conseguimos por vezes perceber as razões do nevoeiro e as outras possibilidades. É a melhor hora para a apreciar, ainda sem aquela luz intensa que nos faz semi-cerrar os olhos e torna mais difícil ver o que está bem à vista.
Já gastamos a Europa, agora temos de ir para África com mais empenho, não chega o trabalho das nossas farmácias a impedi-los de controlar o HIV, a malária, a poliomielite e a doença do sono, não chega explorá-los com a nossa adaptável política de imigração, temos de definir novas fronteiras, já resultou no passado e desta vez não seremos nós a okupar, serão as empresas de alguém e a boa vontade das ONGs a dividi-los de novo, mas, desta vez, segundo regras da economia e quando derem por ela já sugámos toda a riqueza e esqueceram que a sua força está na sua cultura.Eliminar qualquer suspeita de terrorismo e sair como libertadores de povos
Assim se resumia, no blog da CasaViva, a conversa que por lá aconteceu a 7 de Dezembro de 2007, organizada pelo SOS Racismo. Nesse mesmo dia, iniciara-se, em Lisboa, a Cimeira Europa-África, apresentada como um grande sucesso da presidência portuguesa. Iniciara-se também outra cimeira, uma que pretendia desbravar novos caminhos “rumo a uma alternativa para os povos de África e da Europa”.
Cá e lá, na CasaViva, na cimeira oficial e na alternativa, discutiram-se, com diferentes perspectivas, bem entendido, possibilidades de futuro, lançadas por quatro temas principais: desenvolvimento económico; soberania alimentar, agricultura e recursos naturais; direitos humanos; migração. Disso se falou na CasaViva. Disso se falou também na cimeira alternativa. E de alguma coisa do que foi dito deixamos testemunho nos próximos parágrafos.
Os governos europeus, agindo através do Fundo Monetário Internacional, do Banco Mundial e, mais recentemente, da Organização Mundial de Comércio, impuseram programas de ajustamento estrutural radicais aos Estados africanos. Depois de mais de duas décadas de desregulamentação do comércio e de promoção da obrigatoriedade de políticas económicas orientadas para a exportação, de endeusamento da liberalização dos mercados de capitais, da promoção do investimento estrangeiro e da privatização de serviços públicos, são evidentes os efeitos negativos. Não contente, a UE confronta os países africanos com o reforço dessas mesmas políticas através dos Acordos de Parceria Económica (APEs) propostos.
A UE tem também participado activamente, através da imposição do modelo neoliberal, controlado pelas grandes corporações, de agricultura industrial e de produção alimentar, na destruição da soberania alimentar dos povos, anulando a capacidade política dos estados africanos para apoiar as suas agriculturas e proteger os seus mercados regionais. São políticas que promovem a privatização de sementes e da biodiversidade e que ajudam à propagação de Organismos Geneticamente Modificados e do conceito de direito de propriedade intelectual promovido por corporações europeias e outras. Ideias que levam à criação de um mercado global de agrocombustíveis, incentivado por medidas como as metas fixadas pela UE em matéria de biocombustíveis e subsídios para a sua produção.
Perdendo campos de produção agrícola orientada para a alimentação em favor daqueles destinados aos novos combustíveis, estas políticas, que levam ao aumento brutal do preço dos cereais, promovem, duplamente, a fome e determinam uma utilização dos solos que favorece as corporações em relação aos agricultores e às gerações futuras.
Ouviram-se ainda denúncias da hipocrisia do discurso europeu sobre direitos humanos, como se as guerras onde são mutilados não fossem combatidas com armas europeias, como se a impunidade das multinacionais e dos seus crimes não fosse uma realidade, como, enfim, se os seres humanos e os seus direitos, não estivessem, em termos de prioridade, uns patamares abaixo dos sagrados interesses económicos.
Falou-se, por fim, do que, sem o sabermos então, nos voltaria a reunir, a questão das migrações e das políticas europeias que as enformam, orientadas por preocupações securitárias e pela exploração de seres humanos, que criminalizam os migrantes e ameaçam os seus direitos humanos e sociais, quer na Europa quer em África, sem esquecer que a emigração em massa é, em larga medida, o resultado das políticas europeias que privam os africanos de outras oportunidades, violando os seus direitos económicos, sociais e culturais, especialmente o direito à alimentação.
Da conversa, ficaram as informações, as várias formas de encarar uma mesma realidade, diversas perspectivas de solução. Ficou, acima de tudo, a noção de que a exploração colonialista se mantém, revestindo-se, apenas, de capas modernas que a ajudam a legitimar-se.
Sócrates decidiu que não há referendo para ninguém. Bem, talvez não tenha sido ele quem decidiu, mas a verdade é que foi ele quem transmitiu essa decisão. Portanto, foi também a ele que coube a tarefa de explicar o porquê do caminho escolhido.
Eu disse que te dava uma pastilha elástica, mas nunca te prometi que não a mastigava primeiro. Ah! como odiei o meu irmão quando ele me disse isso...
Início da mobilização
O desembarque, em Olhão, e o posterior encarceramento, no Porto, de 23 cidadãos oriundos de Marrocos e considerados ilegais foi a faísca que fez reunir, na CasaViva, respondendo a um apelo da recém-criada Rede Que Alternativas?, algumas pessoas e associações preocupadas com as questões da mobilidade humana. O objectivo era organizar uma acção que, partindo deste caso concreto, colocasse em evidência “a situação dramática em que se encontram centenas de imigrantes que foram vítimas de tráfico humano e que devem ser protegidas”, para além de desmascarar “as políticas de repressão na UE, de externalização de fronteiras”, que “favorecem a exploração desumana de homens e mulheres indocumentados”, como se podia ler no convite da Rede Que Alternativas?.
Um relato da vigília
Por volta das 15h30 do dia 23, uma semana depois, soa o alarme: o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) prepara-se para, ainda nessa tarde, proceder à deportação de mais alguns dos imigrantes detidos no Espaço de Acolhimento de Estrangeiros e Apátridas, Unidade de Santo António, no Porto. Os que chegam ao local pelas 16h30, não vêem sair ninguém. Por volta das 18h00, a advogada de alguns dos detidos informa que já só estavam seis marroquinos.
A deportação vespertina já tinha tido lugar. Cerca das 18h30, umas três dezenas de pessoas concentram-se junto ao portão de entrada do centro, respondendo ao apelo para uma vigília, decidida na noite anterior na sequência das notícias sobre as primeiras operações secretas, e ilegais, de deportação.
Distribuímos um folheto, também ele definido em cima da hora, questionando o ministro da Administração Interna, Rui Pereira, sobre as políticas de imigração europeias, e exibimos uma faixa com os dizeres: NINGUÉM É ILEGAL.
A vigília durou cerca de duas horas. Por volta das 20h30, o deputado José Soeiro tentou visitar os imigrantes para lhes entregar as mensagens recolhidas entre as pessoas que se manifestavam. Foi-lhe dito que eles já estavam a dormir.
Antes de desmobilizarmos, e já depois de marcarmos uma reunião para a segunda-feira seguinte para preparar uma manifestação para o dia 9 de Fevereiro, para exigir a alteração de situações como a presente, subimos a rua e, em frente ao bloco onde os marroquinos estavam detidos, tentámos comunicar com a ajuda de um megafone. Através da língua francesa e também em árabe, falado pelos compatriotas radicados em Portugal e presentes na vigília. Obtivemos resposta, em berros da janela. Durante cerca de cinco minutos, conversámos com eles, fizemos-lhes sentir que havia gente solidária, sorrimos ao ouvir o seu “obrigado”. Findo esse tempo, eles terão sido calados, mas puderam ainda ouvir-nos durante mais alguns minutos, até que a polícia nos impediu de prosseguir.
A vigília, convocada por diversas associações (Aacilus, CasaViva, Gaia, Olho Vivo, Que Alternativas?, Solim, SOS Racismo e Terra Viva), difundiu um comunicado que, além de denunciar o repatriamento, sublinhava que estes imigrantes “foram expulsos do seu país pela pobreza” e no nosso “foram recebidos como criminosos, presos num centro de detenção, privados de liberdade”. O texto lembra que tais pessoas “são vítimas das redes de tráfico” quando “apenas procuram uma vida melhor”, e faz o paralelo com os muitos portugueses que procuraram e continuam a procurar melhor vida noutros países. Conclui acusando a atitude do governo português de “criminosa” uma vez que “devolve os imigrantes à miséria e às redes de imigração ilegal”, que assim se sentem incentivadas.
Lições da expulsão
Do caso dos 23 cidadãos marroquinos que acabaram detidos no Centro de Instalação Temporária do Porto há várias ilações a tirar: sobre a lei de imigração, o papel do governo de Sócrates, a figura do ministro Rui Pereira, e, enfim, sobre o ambiente geral em que Portugal está mergulhado. Comecemos pela lei. No seu articulado lê-se que a imigração ilegal implica o repatriamento. Muito haveria para dizer sobre este princípio, sobre o direito que a história da humanidade consagra a todas as pessoas de se moverem livremente na busca de uma vida melhor, sobre o combate às causas verdadeiras das migrações África-Europa.
Mas prossigamos. Na lei lê-se também que a acção de deportação pode ser adiada, se os detidos colaborarem com as autoridades no desmantelamento da rede de tráfico de migrantes que os enviou para a Europa. Trata-se, note-se, do simples adiar da acção e não do seu cancelamento. Mal o ministro da Administração Interna decida que já não são necessários à investigação, manda que sejam repatriados, leia-se, devolvidos para as mãos dos mafiosos que acabaram de denunciar. Se se quiser combater realmente as redes de imigração ilegal terá que se começar por incentivar a sua denúncia, oferecendo anonimato completo e autorização de residência aos que colaborarem.
Mas voltemos um pouco atrás. Ter-se-ão perguntado se não haveria engano quando, sabendo que vivemos no apregoado Estado de Direito, se afirmou que a decisão final é do ministro. Ter-se-ão perguntado bem, mas a verdade é que terá havido um golpe de Estado silencioso – e uma decisão que deveria ser judicial, legalmente fundamentada, com direito a defesa e recurso, é, afinal, administrativa, dependente do espírito momentâneo do ministro da tutela e da sua sensibilidade própria. Uma lei destas, que protege as máfias e dá direitos discricionários ao governo, não pode continuar a existir.
Mas este caso pôs, ainda, a nu a sensibilidade própria de Rui Pereira, da qual dependia, muito provavelmente, a diferença entre a vida e a morte de muitos deles. Portugal preparava-se para prender os 23, sacar-lhes a informação que considerasse necessária e repatriá-los, no maior dos secretismos. Ouviríamos depois um comunicado onde se louvaria a atitude firme e pronta do executivo. Mas o tiro saiu-lhes pela culatra.Várias associações do Porto pediram para visitar os detidos, que estavam incomunicáveis. Nem resposta obtiveram. Só José Soeiro, e apenas por ser deputado, conseguiu chegar à fala com os marroquinos. Mesmo ele foi impedido de entrar duas vezes: uma, no dia 22, quando os primeiros foram secretamente deportados; a outra, no fim da vigília de solidariedade. No caso da primeira leva de deportados, nem sequer as advogadas foram notificadas da expulsão.
Chegou-se a dizer que o processo estava sob “segredo de Estado”. Aos detidos chegou a ser dito, por pessoal do SEF, que eles seriam expulsos porque havia umas associações que estavam a fazer pressão para que isso acontecesse. Uma prática baixa. Ou, talvez, o assumir que o barulho da sociedade civil dá mau aspecto, e o melhor é acabar com as coisas depressa, que se lixe a lei e o humanismo. Estes cidadãos marroquinos, ao abrigo das mais recentes leis europeias de controlo de seres humanos, estão agora impedidos de tentar entrar no espaço europeu. A partir de agora não são apenas imigrantes ilegais. São pessoas banidas da UE, com fichas individuais centralizadas e disponíveis a todas as forças policiais do espaço Schengen, com possibilidade de virem a fazer parte da grande base de dados de indivíduos impedidos de entrar na “civilização ocidental”. Voltarão, como já disseram que fariam, mais fragilizados, dando, de novo, dinheiro às máfias do tráfico humano, correndo, mais uma vez, risco de vida. Portugal é, neste momento, um país onde há associações de imigrantes que se solidarizam com os marroquinos detidos e deportados, cujos membros aparecem nas mobilizações, mas que não subscrevem oficialmente os textos que se vão lançando, porque têm medo de represálias. São associações com ligações a vários níveis do Estado e que preferem não assinar coisas que critiquem algum aspecto da actuação governamental. Sócrates conseguiu.Mas é também o país do jornalismo domesticado onde não há perguntas incómodas, a terra onde um profissional da informação está impedido de comunicar com os detidos e não protesta contra esse facto. Não se digna, sequer, a levantar a questão.
Lições da mobilização
Denunciar a brutalidade da actuação do governo português neste caso concreto e exigir a alteração da lei criminosa que protege de facto as redes mafiosas de tráfico de migrantes foram as razões que motivaram a ideia de uma concentração na tarde de sábado, 9 de Fevereiro, na Praça da Batalha. Para que, enfim, se pugne por esse direito fundamental que é o da livre circulação de seres humanos, sem esquecer que as migrações têm causas e que, essas sim, devem ser alvo de combate internacional. Consigamos que a miséria e a fome se transformem em memórias do passado e poderemos deitar as fronteiras ao lixo.
O resultado foi o esperado, tendo em conta a qualidade da organização. Uma concentração boicotada por pessoas que não cumprem o que se comprometem a fazer, um evento acordado quase histericamente por outras que o esvaziaram de entusiasmo com a sua ausência de participação, não poderia dar mais do que um encontro de amigos à sombra de duas faixas. Bonitas e certeiras, por sinal.
Deu, de qualquer modo, para distribuir centenas de comunicados semelhantes ao que se reproduz por estas páginas e uma centena de um outro texto, mais pormenorizado, sobre a questão das migrações.
A recente expulsão dos marroquinos detidos na unidade habitacional de santo António veio não só expor uma lei incompatível com os mais básicos direitos humanos, como também confirmar a natureza dos poderes governantes. Vivemos num Estado de excepção mais permanente para os mais pobres do que para os mais ricos em que leis, direitos, liberdades e garantias perdem o seu significado perante os interesses de estado e da economia. Só assim se explicam as ilegalidades processuais cometidas neste processo, como a supressão informativa realizada às advogadas das pessoas expulsas, ou simples omissões jurídicas, como a recusa em aplicar a cláusula que adia a repatriação caso os detidos colaborem no desmantelamento de redes de tráfico de imigrantes.
Há muito que existem prisões para imigrantes – obra do actual presidente da república Cavaco Silva, enquanto chefe de governo – onde estes são detidos porque simplesmente estão onde não podem estar. Por nada mais. Há muito que se mantêm pessoas na clandestinidade, para que possam trabalhar sem contratos e sob salários de miséria. Há muito que se esqueceram as histórias dos avós e bisavós que entraram, permaneceram e trabalharam ilegalmente em França e outros países da Europa.
Porque não são as pessoas que atravessam as fronteiras, mas sim estas que se atravessam nos caminhos das pessoas, negando assim uma qualidade inerente ao humano: o desejo de ir além, de procurar, de conhecer. Tudo isto é muito anterior à existência de fronteiras. Tudo isto continuará quando forem abolidas.
Poucas vezes um acontecimento de solidariedade terá atingido de forma tão certeira o seu objectivo como a conversa que decorreu na tarde de 22 de Dezembro passado, dedicada ao povo basco e à sua luta. Quem teve o privilégio de estar na CasaViva a ouvir e interpelar Rui Pereira e alguns activistas da ASEH – Associação de Solidariedade com Euskal Herria saiu de lá com conhecimentos históricos e pinceladas de actualidade que ajudam a compreender definitivamente o sentimento nacional basco. Ora, quando se acredita que uma causa é merecedora de solidariedade, nada melhor do que partilhar o que se conhece, de forma a que a informação permita que novas pessoas possuam argumentação suficiente para ir desfazendo as inverdades que os poderes político e mediático paulatinamente inculcam.
Foi isso que aconteceu. Rui Pereira, jornalista e autor do polémico livro Euskadi - A Guerra Esquecida dos Bascos, cuja segunda edição foi, alegadamente, comprada quase na totalidade pelo Estado espanhol para a impedir de circular, abriu uma conversa enormemente pedagógica onde se debateram as razões históricas que conduziram ao conflito e a repressão de que é, actualmente, alvo um povo tão próximo de nós.
A “guerra do norte”, como lhe chamam os militares em Madrid, é o último processo político europeu com uma componente militar activa, agora que o IRA, por exemplo, baixou as armas. “É um conflito de baixa intensidade militar e altíssima intensidade política”, descreveu Rui Pereira. Euskadi foi o laboratório duma agenda repressiva mundial. Foi lá que se ensaiou a teoria da guerra total, que prevê operações militares de conquista e de controlo social das populações, através da policialização do conflito. A determinada altura, deixou de se tratar da luta dum exército contra um movimento armado e passou a ser apresentado como um caso de polícia, onde há criminosos que têm que ser detidos, porque atentam contra a democracia. Este véu, que transforma o conflito numa coisa que ele nunca foi, chama-se propaganda e está inscrita no topo do livro de instruções da guerra total que Espanha iniciou nos anos 80 e a que todo o Ocidente, entretanto, aderiu. A partir daqui pode-se fazer o que se quiser, testando os limites da tolerância internacional, que aumentou brutalmente depois de 2001. Tal como acontece hoje com Guantánamo e mais umas prisões secretas a soldo dos “aliados” já Euskadi tinha sentido na pele as deportações de pessoas sem culpa formada para “zonas de não direito”, territórios longínquos e sob domínio dos serviços secretos do Estado espanhol.
No seguimento do 11 de Setembro de 2001, as coisas pioraram. Mas já lá vamos. Antes, será melhor respeitar a ordem que a conversa seguiu e lembrar que o País Basco é uma entidade mais antiga do que Espanha. Ou que o priemiro rei basco foi coroado três séculos antes de D. Afonso Henriques. Militarmente, o conflito com Castela existe desde o século XIII. Em 1521, o reino basco de Navarra cai. Em 1580, cai Lisboa. Trata-se, referiu o jornalista, do “mesmo movimento expansivo do centro, de Madrid, para a periferia. Do mesmo modo, nessas periferias, em Portugal, na Galiza, na Catalunha, no País Basco, começa a enraizar-se o repúdio pelo centro. De todas essas zonas, apenas Portugal logrou, já no século XVII resolver a sua questão”. Os bascos, por exemplo, ainda não a resolveram.
Mesmo dominando militarmente a zona, os reis de Castela sempre respeitaram os chamados “foros”, a democracia rural basca, forma através da qual a sociedade se organizava e pela qual sempre manteve uma autonomia relativa. Esse respeito pelos “foros” durou até ao século XIX, mais precisamente até 1871, altura em que foram suprimidos, juntamente com a última fronteira que separava Espanha do País Basco. “Tudo isto foi pura conquista militar”, repetiu várias vezes Rui Pereira, para que não deixássemos de o ter presente. Surge aí um novo nacionalismo, uma reinvenção duma tradição basca encetada por alguns pensadores e que esqueceu Navarra. Os territórios desse nacionalismo são definidos como Euskadi e integram Vitória/Gasteiz, Bilbau/Bilbo e San Sebastian/Donostia. Tinha, como todos os nacionalismos do século XIX, características marcadamente racistas e dele emergirá o Partido Nacionalista Vasco (PNV).
Em 1936, depois do que conhecemos por guerra civil espanhola, nome recusado pelos bascos, a vitória das forças de Franco deu origem a uma desbasquização, onde se mudaram nomes a mortos, onde se proibiu a língua e o baptismo com nomes bascos, no que foi um dos processos mais violentos do fascismo europeu de descaracterização de comunidades”. Em 1958, um grupo de jovens estudantes de S. Sebastian/Donostia e Bilbau/Bilbo, descontentes com a inacção do PNV, formaram um grupo a que chamaram Ekin, o que significa “Fazer”. E agir era, de facto, o objectivo deste grupo. Se necessário, com recurso à vertente militar. É daqui que nasce a ETA, que viria a ter um papel preponderante para a “transição democrática” espanhola (que Juan Carlos impôs no seguimento da morte de Franco), ao fazer explodir Carrero Blanco , “delfim do ditador, que ficou, assim, sem o sucessor que tinha vindo a preparar”, como notou Rui Pereira.
Se as coisas melhoraram momentaneamente, foi porque se tornou difícil articular a repressão, agora que o Estado espanhol entrava no clube das democracias, agora que escasseavam ditaduras amigas e agora que surgiam, por toda a Europa, movimentos armados. As estruturas mantinham-se, que a “transição democrática” não lhes mexeu, mas os objectivos passavam a ter dois sentidos: por um lado, “evitar que os comunistas tomassem conta daquilo” e, por outro, “evitar que Espanha se separe”. Entra-se, assim, em plenos anos 80 do século XX, no que o jornalista apelida de “democracia a duas velocidades” que transformou o problema nacional basco num problema policial espanhol e em questão repressiva à escala internacional. Entra-se na fase da guerra total.
Em Dezembro de 2001, surge um novo desenvolvimento, quando Baltazar Garzón declara ao ABC, diário de direita do Estado espanhol, que “não existe envolvente da ETA. Tudo é ETA”. Inaugura-se, então, uma nova fase, a que traz a possibilidade de declarar ilegais organizações inteiras. Desde então, aconteceu isso mesmo a 290 associações, entre elas grupos de mulheres, de jovens, de moradores. Tudo é ETA.
O PNV, partido actualmente no poder, é, oficialmente, independentista. É um partido democrata-cristão mas que, em muitos pontos, está muito à esquerda do partido socialista de Sócrates, por exemplo. Se, por um lado agrupa grande parte do empresariado basco, por outro, é-lhe afecta a maior central sindical basca. É tão abrangente que, na sua indefinição, se limita a uma prática de administrador da situação que existe. É, na teoria, revolucionário, porque afirma querer uma situação nova e, na prática, do sistema, porque não provoca nem cria novas situações Tem-se valido do chamado pragmatismo para se manter no poder, mostrando-se como alternativa única ao PP, e baseando-se no vamos, por pequenos passos, caminhando para uma autonomia maior, até que se possa reivindicar algo mais. Mas não se livra de ter ajudado a instituir a ideia de que o problema do País Basco é um problema de paz, quando se trata, de facto, de um problema de justiça.
É que, ainda hoje, a situação repressiva é de tal ordem que não se reduz à vertente militar, antes pretende retirar todo o oxigénio que permitia ao sentimento basco respirar. “O independentismo basco construiu espaços alternativos que o Estado espanhol não conseguia controlar institucionalmente. Havia vida para além do Estado espanhol. Foi isso que se quis destruir”, alertou Rui Pereira. Por estes dias, “há cidades fechadas por check points, há tortura, há presos políticos espalhados por todo o território do Estado espanhol, há revistas a 50 pessoas por terem o aspecto errado. Decidem que uma pessoa é terrorista e ilegalizam a associação a que pertence”.
Depois da conversa, a música solidária, que, como se pode ler no blog da ASEH, “começou com o hip hop corrosivo dos Stregul para, depois, dar lugar ao punk dos Sobressaltos e ao metal dos Razer. Durante os concertos, um projector lançava vídeos sobre a parede que ilustram bem o dia-a-dia do povo basco e da repressão que vive”.
Um ano e seis dias depois da primeira vez e oito meses e dezasseis dias depois da segunda, os frics voltaram à CasaViva. Desta vez a convite do movimento Porta 65 Fechada, que promoveu, em Fevereiro, um fim-de-semana de contestação ao Porta 65, o novo programa de apoio ao arrendamento jovem. A energia da Fanfarra Recreativa e Improvisada Colher de Sopa, vulgo FRICS, abriu as hostilidades no Porto. Imprevisto prenúncio: nesse mesmo mês, no último conselho de ministros, o governo alterou algumas das regras de acesso ao Porta 65 Jovem.
O Porta 65 Jovem substituiu o anterior Incentivo ao Arrendamento Jovem (IAJ) no final do ano. Mal foi anunciado, surgiu o Porta 65 Fechada, um movimento cívico apartidário contra as regras do programa. Razões da contestação: critérios de pré-selecção “absurdos”, rendas máximas admitidas “desfasadas da realidade”, taxa de esforço que “exclui a maioria dos jovens em início de actividade profissional”, redução da duração do apoio e orçamento anual “claramente insuficiente”. A primeira fase de entrega de candidaturas ao Porta 65 Jovem decorreu entre 3 de Dezembro e 3 de Janeiro. Foram contabilizadas 3561 candidaturas, um número muito aquém das 20 mil esperadas pelo governo.
O Porta 65 Fechada reforçou a contestação, reclamando a “alteração profunda” das condições de acesso ao novo programa, através da revogação do respectivo diploma legislativo. Nesse sentido, lançou uma petição on line e entregou, a 21 de Janeiro, uma carta a Cavaco Silva, pedindo a interferência do Presidente da República.
Para dias 9 e 10 de Fevereiro, programou um fim-de-semana de contestação nalgumas cidades do país. Concretizou-se em Lisboa e no Porto, onde a tarde de domingo foi reservada a manifestações nas baixas das cidades.
No Porto, o desfile, de cerca de uma centena de pessoas, vindas de outras cidades do país, durou umas duas horas, da Praça da Batalha à Avenida dos Aliados. Indignadas com as novas regras de apoio ao arrendamento jovem, gritaram: "Porta 65 está fechada; é política de fachada". Dezoito dias depois, no último conselho de ministros do mês, o governo altera duas regras: aumenta os valores das rendas máximas admitidas e passa de 40 para 60% o peso máximo que as rendas podem ter no rendimento mensal dos candidatos. Por outro lado, alarga a possibilidade de candidatura dos antigos beneficiários do IAJ a todas as fases do Porta 65. O Porta 65 Fechada “congratulou-se com algumas das alterações”, mas “criticou a duração do apoio, o orçamento e os valores da comparticipação das rendas”, noticiou a Lusa.
FRICS com Porta 65 Fechada
Era já noite de sábado, 9 de Fevereiro, quando a Fanfarra Recreativa e Improvisada Colher de Sopa iniciou mais um memorável concerto num momento peculiar da sua carreira: um ano e seis dias depois de gravar o primeiro CD e a seis dias de fazer um ano que iniciou, em Aveiro, a Capitais*De*Distrito*Por*Ordem*Alfabética*Tour, conforme enfatizou o Sr. Silva, percussões e organeta. Acompanhavam-no, nessa noite, o Sr. Almeida, trompetes e assobios, o Sr. Costa, percussões, o Sr. Fernandes, contrabaixo, o Sr. Martins, saxofone, o Sr. Ricardo, sintetizador analógico, o Sr. Saldanha, bombardino e trombone, o Sr. Rocha, trompetes e percussões, e a Sra. Ana Luísa, guitarra e percussões, a estrear a presença feminina na fanfarra, como sempre coordenada pelo Dr. Hostilino, o Tele-Maestro.
Nessa noite, a CasaViva encheu, como um ano menos seis dias antes, no primeiro concerto que acolheu dos FRICS, que então gravaram “AbraçoVivo”. Da primeira vez, em 3 de Fevereiro de 2007, como da segunda, em 24 de Maio seguinte, a fanfarra incendiou o público.No final, guitarra e contrabaixo acompanharam Antónia Reis na apresentação do hino do movimento Porta 65 Fechada, uma adaptação de "A Casa", de Vinicius de Moraes. Depois do jantar, houve projecção de vídeos do movimento V de Vivienda que, em Espanha, luta pelo direito à habitação, mobilizando manifestações com milhares de pessoas, e de reportagens realizadas pelos media portugueses sobre o Porta 65 Jovem. O evento teve como principal objectivo mobilizar os jovens para a manifestação da tarde seguinte.
porta65fechada.net
porta65.blogspot.com
Que representatividade têm hoje os sindicatos? é a questão que inquieta José Nuno de Matos e que o conduziu num estudo de caso sobre o Sindicato de Professores da Grande Lisboa: Acção Sindical e Representatividade, publicado em 2007, pela Autonomia 27.
Num mundo de trabalho em crise com o modelo salarial, em que os empregos já não são para toda a vida e em que a precariedade aumenta à medida que decrescem os assalariados efectivos, que representatividade têm os sindicatos? Quando o Estado é o primeiro interessado no bom funcionamento dos sindicatos e estes cada vez mais se assemelham a partidos políticos ou a empresas, caçando associados a troco de descontos em determinados produtos ou serviços, que representatividade têm, hoje, os sindicatos?
Sobre isto se conversou em 24 de Novembro último, quando José Nuno Matos esteve na CasaViva a apresentar Acção Sindical e Representatividade. Não houve respostas mas o debate foi caloroso.
Algures entre as 178 páginas do livro, Zé Nuno salienta que o trabalho, ainda que continue a ser um elemento central da vida das pessoas, não pode ser mais definido como a «questão» das sociedades, e considera que o militantismo deixou de ser um monopólio operário e sindical, adquirindo um cariz multidimensional. No futuro dos sindicatos, só vê duas opções: “ou manter um modelo virtualmente representativo ou, pelo contrário, perfilhar novas formas de acção e representação, definindo-se como um novo movimento social”.
“José Nuno Matos lança um novo olhar sobre uma das estruturas sindicais que provavelmente mais irritação suscita na generalidade dos comentadores. Mas faz mais do que isto. Na verdade este livro mete-se três vezes em caminhos por hábito indevidos a uma tese de mestrado”, escreve José Neves, no prefácio. “O problema fundamental que o autor aqui se coloca não é tanto o do sindicalismo dos professores ou sequer o sindicalismo mas sim o da representatividade em geral, oferecendo-nos o autor uma leitura tendencialmente libertária e autonomista da acção política.”
Acção Sindical e Representatividade, de José Nuno Matos, está disponível para leitura na CasaViva.
A Marcha Global da Marijuana (MGM) é uma iniciativa apartidária, pacífica e sem fins lucrativos, organizada por cidadãos conscientes e informados que consideram ter direito a consumir uma substância que, no seu estado natural, não representa um risco tão grande como as substâncias adulteradas que se obtêm no mercado clandestino.
www.mgmporto.org
www.mgmlisboa.org
www.globalmarijuanamarch.com