Abrigados mas livres
Sendo a mobilidade um sinal dos tempos, onde o local de trabalho e de estudo é agora um lugar cada vez mais temporário, onde com mais frequência temos a necessidade de recomeçar as nossas vidas, evitando uma conjuntura socioeconómica e política cada vez mais repressiva, o que parece fazer sentido é desenvolver uma lógica do mercado de arrendamento mais favorável. Ao invés de continuar a favorecer os lobbies da construção, do betão e das imobiliárias, onde a compra de casa atinge preços absurdos, num mercado que insiste em assim permanecer, apesar da falta de poder de compra da classe média, apesar dos grandes centros urbanos transformarem o seu tecido em tecido devoluto, criando as condicionantes para a sua ruína.
Entretanto, aumenta a promiscuidade das autarquias com bancos, imobiliárias e grandes empresas de construção. Em que estas megaestruturas económicas financiam as campanhas dos partidos políticos com mais representatividade no país e, à troca, viciam-se os concursos de arquitectura, enriquecendo cada vez mais os caciques da construção que dividem entre si o território nacional.
O que parece fazer sentido é rentabilizar os recursos existentes, preservar e reciclar, num esforço e numa lógica de arquitectura sustentável. No entanto, abrimos espaço a uma construção de arquitectura duvidosa e descaracterizante, caminhando para cidades sem história, com edifícios transformados em autênticas máquinas de gerar dinheiro e onde todos os intervenientes têm responsabilidades.
E, no meio deste absurdo, deixa de ser rentável para os senhorios manter as suas propriedades sem exagerar no valor da renda e para os arrendatários aguentar esta despesa, onde comprar casa já não é investimento, mas, sim, certeza de endividamento.
Afinal, o que parece fazer sentido é alienar todo o património edificado. Para quem e para quê? Não sei, se calhar para todos e para ninguém, pois todos precisamos de um abrigo, mas não precisamos de ser donos desse território, pois de recolectores passamos de novo a caçadores de uma vida melhor e mais diversificada como contraponto desta globalização intoxicante.
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